quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Chupa essa manga


                Estava eu a ler Fatos de Fato, blog da Mary Miranda, e eis que um post sobre “Mangas” lembrou-me variadas mangas, de manguitas que nunca mais vi às mangas rosa de quintais alheios, cobiçadas e muitas vezes roubadas, como as mangas de fiapo da casa de D. Juscelina.Em uma  ocasião inclusive, em galho altíssimo, estava uma lá posta em sossego tal Bela Inês, dependurada e brilhante à luz do sol, e Patrícia, prima minha, a olhava cobiçando a dizer que podia cair, e... Com uma brisa rara naquele calor de Floriano, a tal manga cai, e ela corre apanhando para lavá-la e degustá-la com gosto. Lembro também das manguitas, pequeninas e cheirosas que comia quando morávamos em Minas e que meu pai na feira comprava às dúzias. Uma vizinha, excepcional, que em sua infância tinha dificuldade ao falar, sempre que íamos à feira, vinha em casa e dizia que “A mamãe mandou falar pra mandar uma manga pra ela, pra colocar na ferida de papai”. Não sei de onde ela deve ter tirado que manga poderia servir como cataplasma, e como sabíamos de certo que as mangas não seriam para curativos, sempre dávamos a ela mangas para a família toda.
 

                Já as dúzias de mangueiras de tia Maída tomam um enorme pedaço de chão na roça do “quebra cangalha” e não posso lembrar dela sem lembrar do padre que ao pedir algumas colocou dois sacos no carro dando voltas que víamos da janela, mas pra finalizar o serviço pegou apenas meio saco e passou mesmo pelo quintal da casa (na fazenda). Escorregou rolando saco, mangas e padre... Tia Maída, com seu sorrisinho malicioso de canto de boca, apenas falou sobre o castigo: “Mas que bobagem, pode pegar à vontade, que as mangas estão a fazer lama, e tem tanta gente na paróquia...”  
 
                Lembro das mangas rosa de Dona Caetana, avó da esposa de um primo, de quem eu muito gostava, e ela de mim, tanto que, mesmo em outra cidade, sempre que tinha oportunidade, ela mandava-me sacolas de manga. Quando ia visitá-los é que comíamos com gosto. Chegava às vezes de madrugada das festas, sentávamos eu e minha tia Teresa, na praça em frente a casa e às quatro de “la matina” púnhamo-nos a comer manga rosa... 

                Aliás mangas rosa me perseguiam. Quando em Recife, as mangas rosa da casa do Terceiro, que morava em Olinda, eram saborosíssimas, e ele como bom amigo sempre me dava aquelas delícias. E lembrando as mangas de sua casa não há como não lembrar que lá também havia pimenta malagueta, e que certa feita um tio dele colheu um pacotinho e o levou no bolso de trás da calça. Contou depois as peripécias de quando se sentou no ônibus que o levaria à casa e as pimentas com a pressão do peso... bem, fizeram sentir seu ardor... e ele sem lembrar a causa do sofrimento tentava se ajeitar na poltrona e mais esmagava, e nisso mais elas ardiam em uma região tão inóspita que mesmo quando “caiu-lhe a ficha” sobre o porque de seu tormento, e tirar dali o saquinho de pimentas, o mal estava feito e o pobre velhinho ficou a arder-se por horas. 

                Mas voltando às mangas lembro-me do Rogério Magri, ministro do governo Collor, que em uma viagem para reunião da OIT em Genebra na Suiça, faltou à reunião e afirmou que tinha saído para comprar... “Mangas”...
 
                Bem, ela poderia ser a fruta do pecado no lugar da maçã, que é mais seca, e a meu paladar causaria mais tentação. Mas as da casa do Sr. José, pai da Socorro Rocha, eram algumas das mais saborosas que já provei. Tinha espécies que apenas por lá vi, e eles nos mandava aos quilos; aliás tinha uma que chamávamos manga de quilo, devido a sua dimensão e peso. Muitas vezes estive debaixo daqueles pés, enquanto Socorro ou Maria José lavavam roupas com água do poço... Era realmente um pedaço de paraíso aquele quintal.
 
                Na praça atrás da Faculdade de Direito no centro do Recife, existe também dessas mangas enormes (assim como jambos roxos) e é preciso cuidado quando elas estão maduras e a cair. Em um bar que ia muito no Jockey em Teresina, acima das mesas, as mangueiras iam alto e perigosas. Mangas pairavam por sobre nossas cabeças enquanto a cajuína aplacava calor e adoçava boca e espírito. Nunca fui atingido por uma manga, fruta asiática que aqui (em que se plantando tudo dá) plantada se adaptou tão bem que parece nativa. Em boa hora um antigo prefeito de Floriano (Pi) arborizou a cidade com elas. As mangueiras, da família Anacardiaceae, estão por toda cidade, abençoada sejam.


17 comentários:

  1. acho um tanto grande demais, mas como sempre desperta na gente lembranças que ninguém sabíamos que tínhamos.

    Bjs

    J

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    1. Rosa é minha preferida, mas nunca levei mangada lembro muito do sitio de minha vó com manga rosa e o cheirinho de perfume !!!!!

      Gil

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  2. Olá, Dja!

    Adoro suas histórias, é realmente para lembrar-mos da nossa saudosa infância.
    Bjs Flávia

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  3. Gosto de mangas tanto quanto gosto das suas crônicas.
    Bjs.

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  4. Advinha o que escolhi para sobremesa.... manga, lógico! Minha fruta preferida e o que é melhor, ela já estava descascada e fatiada. Aliás, convenhamos descascar manga dá um trabalho....
    Adorei o texto, fiquei saudosa dos tempos em que passava as férias em Minas. Bj, Rayssa

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  5. Como sempre seus textos rebuscam as lembranças que estão lá quietinhas e quentinhas no fundo do coração. E para mim, manga é lembrança....
    Nunca comi manga colhida direto no pé, ou que tenha acabado de despencar ao solo. Mas sempre adorei esta fruta, ainda que na minha infância conhecesse apenas uma, aqui em São Paulo chamada de Manga Espada, pequenina, doce, mas cheia de fiapos ‘mardito, fiapo de manga, preso no maxilar inferior’...como cantava Zé Rodrix e o grupo Joelho de Porco nos idos dos anos 1970...rssss....Mas tenho boas lembranças com mangas, porque me lembram meu pai. Ele adorava essa manga espada e sempre se deliciava ao comê-las. Hoje eu me delicio em lembrar ele, sempre muito sério, mas muito carinhoso, que para comer mangas tinha um ritual. Papai só usava camisas de mangas compridas, sempre dobradas até um pouco abaixo do cotovelo (dava-lhe um charme especial, mostrando os braços muito brancos com veias grossas e salientes que eu adorava ficar brincando de apertar...). Quando ia comer manga espada, dobrava um pouco mais a manga da camisa, tirava a aliança (que era colocada no bolso da camisa, junto com seu eterno companheiro, o maço de cigarros). Daí estava preparado. Cuidadosamente, fazia pequenos cortes verticais na casca que depois ele puxava, levantando aquele monte de fiapos. Primeiro chupava a polpa que havia ficado grudada na casca, ou oferecia a mim, mimada e sempre esperando pelo agrado....depois cortava pequenas fatias que equilibrava na faca para levar à boca, por fim cravava os dentes na fruta, ou no que sobrava colado ao caroço, sorvendo o caldo, mordendo a polpa, com o caldo grosso escorrendo entre seus dedos....literalmente, comia de se lambuzar...ah, papai. Acho que a manga também o fazia lembrar de sua infância, em Barretos, comendo a fruta caída do pé, como você, Djair também traz esse prazer em sua memória. Sou menina da cidade, nascida e criada longe de pés de manga, mas adoro a fruta. Hoje podemos experimentar várias: Haden, Tomy, Palmer, minha preferida....como pura ou acompanhando a salada de rúcula...hum....delícia...Mas sou mais contida que meu pai. Corto e retiro a casca com faca, corto em pequenos pedaços (felizmente, não tem tantos fiapos!) e como com garfo, sem fazer lambança...mas o aroma e o sabor sempre me levam à minha infância e ao meu pai comendo de se lambuzar no seu momento de lembrança....ih, rimou...rssss....obrigada Djair por remexer essa doce lembrança...
    Bjs! Wânia

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  6. Ah, acabei de comer manga de sobremesa, Duas fatias docinhas e, como disse alguém aí em cima, tb já estavam descascadas no restaurante. Minha mãe que fala que em casa a única que gosta de frutas é ela, mas quando ela descasca todos resolvem "gostar", rs Confesso que sou preguiçosa para descascar mangas, rs Bjs

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  7. Olá
    Menininho
    Esse texto me fez recordar minha cidade onde eu morava que era no interior de São Paulo no tal "VALE DP PARAIBA" onde no quintal de casa tinha uma mangueira a chamada manga espada, onde minha mãe ficava se deliciando com a fruta.
    Voce me faz viajar no tempo com seus textos, alias cada texto me causa uma reação.
    bJS
    Menininho

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  8. As mangas... Nunca imaginei que elas rendessem tanta inspiração, Djair! rs

    Como bem sabe você, sou suspeita para falar delas porque as amo demais!!!! (Hoje peguei uma do chão e "tracei", uma que acho que é a derradeira da safra. Que gostosura foi saboreá-la!...)
    Puxa, eu meio que viajei dentro de tantas mangas enfocadas por você, uma delícia de crônica, que estou degustando com prazer!
    A história do padre ( olha o pecado da gula! rs) foi hilária e a da mocinha que fingia que era para o machucado do pai (essa é imbatível!), são as mais marcantes!...
    Também acho que manga deveria ser chamada de fruta do pecado, ao invés da maçã pois me causa mais desejo... (Dois pecados, viu? Da gula e da luxúria! rs)
    Um dos meus amigos blogueiros disse que em sua chácara tem umas mangas também de quilo, que ele apelidou de "mangão" (vi as fotos e são grandes mesmo!), que me apeteceu em querer conhecê-las...


    Um belo texto que amei ler, tenha certeza disso!
    E me senti honrada por ter sido mencionada em seu maravilhoso post!
    Você escreve muitíssimo bem e, claro, quando possível, estarei por aqui!!!!

    Um forte abraço e um OBRIGADA!

    Mary:)

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  9. Me fez lembrar Pedreira/SP. Tem muitas mangueiras nas margens de um rio. E de uma vez que estive com meu filho colhendo mangas em uma fazenda… tempo bão…

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  10. As lagrimas caem em meu rosto pelas lembranças... Meu Deus... Que momentos... Obrigado por lembrar que não há melhor remédio do que a certeza do porto seguro... Deus te abençoe amado... Saudades... A pimenta foi o doce do texto... Parabéns...

    Arundo Terceiro

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  11. Manga tem gosto de infância pelo menos para mim.Lembro de ter levado um tombo quase mortal de uma mangueira,o que não se faz por uma manga.Isso faz tempo,uns 12 anos atrás.Fiquei traumatizada com aquele tombo,e por um bom tempo detestei manga.Hoje em dia só compro manga de supermercado porque é a única viável para mim,mas não me esqueço de quando eu ia pro sítio e comia muitas mangas,e levava muitos tombos de mangueiras também.Era assim:a cada tombo,uma manga,mas era divertido.Bons tempos..
    Beijão,Djair!Um lindo final de semana para ti.Dani

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  12. Eu, "bicho de cidade", lendo um texto como esse me sinto como se estivesse descobrindo outro mundo, outra vida...rsrsr
    Adorei!!!!

    bjss

    Sil

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  13. Oi de novo meu querido...te dizia que vc me faz voltar no tempo...me lembro quando criança que chupávamos umas mangas pequeninas que chamávamos de "manga coquinho" e era um torrao de acúcar...arrancávamos a casca com a boca mesmo e nos sujávamos até as orelhas...tempo de criança despreocupada...sadia...solta e livre que já nao volta mais pelo nesta encarnaçao...adoro mangas e chego a sentir até o aroma das mangas...desfrutei muito da minha meninice livre..subindo em árvores...pescando...aí a gente cresce e ficam as boas lembranças que nos fazem companhia nos dias frios e cinzentos de inverno...obrigada por me levar a um passado muito feliz...bjos com carinho...Soni@

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  14. Ô que texto delicioso, deu água na boca.
    Eu que fui menina levada, nascida e criada na Rua da Mangueira, tinha por hábito subir nas mangueiras, chupas mangas e atirar o caroço nos transeuntes.
    Por conta dessas travessuras tenha umas cicatrizes, resultado de quedas e escaladas entre os galhos. Eita diabo!!!

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