quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

A chegada da velhice


Primeiro são uns poucos fios brancos nos cabelos, um aqui, outro acolá, leva-se na graça, acha-se bonito, até porque no dizer de uma amiga, não são nada demais, “fod* é mesmo o primeiro pentelho branco, esse sim te dá direito a três dias de depressão sem sair de casa...” Aguardemos... Mas ai, vem alguém, uma tia inconveniente por exemplo, e de graça arranca o fio. Logo alguém emenda: “_Ahhh mas se alguém arranca um nascem três.” Seja pela crendice, seja pela idade que chega imperceptível, eles aumentam, gradativamente. No inicio ficam bonitos, caem bem, dão um charme, e na foto do passaporte dão aquele ar respeitável, como se cabelo (branco ou em forma de bigode) fosse sinônimo de respeito. Às vezes tentamos escondê-los, e vamos às tinturas, sem receio de repetirmos o papel de Dirk Bogarde em Morte em Veneza. Outros muitos optam pelo boné, e aos quase sessenta os usem virados para trás como se fossem um jovem skatista. E quem nem sabe o que é ciático, que dirá dor... A morte é a mesma, só não tem o Mediterrâneo de fundo. Pelo menos livra-se da cena trágica de, ao morrer, o último suor escorrer pelo rosto com a cor da tinta que tentava ocultar a idade.

Mas, a vida continua, vamos a ela... Uma bela tarde está concentrado no trabalho e começa a perceber o quanto tem errado, palavras, números, e resolve marcar um oftalmologista... Suuuuurpresa! Não 0,25, não meio grau, mas uma bela e grande pontuação... Sim, a vista cansou, talvez o brilho dos olhos já tivesse ido na frente e não percebemos, afinal eles estão mesmo embaçados... E ai um dia ao levantar... Dor nas costas? No joelho? Na coxa? Friagem? Mau jeito? Não, é ela com seus passos de alma que mostra que chegou. Como diz a mesma amiga já citada: “depois dos quarenta, no dia que você acorda sem dor, pensa logo: Morri!” Mas vamos indo, pelo menos a dor circula, cada dia é num lugar, para não ficar monótono, claro!

E à medida em que os anos passam, as saudades de tempos passados vão ficando mais frequentes, é a grapette que não existe mais, o bolo de laranja que a tia fazia, o sorvete em tal lugar, e mesmo espécies de fruta que desapareceram. Essa nostalgia também é na verdade... saudades do que éramos àquele tempo, mais agéis, mais alegres, mais despreocupados.

É comum em uma festa mais... “elaborada” cruzar com senhoras muito, muito entradas em anos e vê-las sem uma ruga, nenhuma ruga. Nem de expressão. E ainda dão-se graças aos céus quando a tóxina butolinica é o balsámo da fonte da juventude, pois o efeito bisturi costuma ser pior. Aquela impressão de que se ela sorrir, faz xixi...

Conheço gente que evita envelhecer evitando o assunto. Falou-se em idade, envelhecimento, ou qualquer pormenor que os lembre, fecham a cara, fecham-se em copas. Será senilidade ou medo?

Homens e mulheres tentam aprisionar a juventude mantendo relações, ao mais vezes extra-conjugais com parceiros mais jovens. Como vampiros tentam sugar-lhes a juventude, como se pudessem absorver a pele tenra, o viço no olhar. Não a tôa vampiros exercem há tempos fascínio, na literatura, no cinema, salvo raras excessões são representados como belos, jovens, sensuais.

Bem enquanto escrevia envelheci, células morreram, fios embranqueceram. É inevital e a melhor maneira de envelhecer é... Não querer fugir da própria idade.



sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Alegres tristezas


             A tristeza não tem razão, ela chega e se instala simples assim. 
 
            Tem coisas que a deflagram, lógico. Um chefe escroto, uma falso amigo, uma traição de qualquer nível, trabalhos enfadonhos, leituras feitas por obrigação onde o autor é prolixo em texto chato e demasiadamente técnico... Se bem que há quem goste dos textos técnicos, como há os que apreciem em romances apenas a técnica e não a sensibilidade mostrada em nuances, aquela gama de sabores que o bom autor traz e que é capaz de nos entristecer também, mas de forma diferente, aquela tristezinha gostosa chamada nostalgia. Que acontece até com e sobre lugares que não conhecemos, coisas que não vimos.

            A tristeza chega no crepúsculo, tarde da noite, ou no alvorecer. Ela não se faz de rogada, íntima que é, não bate à porta. Chega! Pronto!

            Em geral, dura pouco, se bem que há os que se apegam a ela, e erguem-lhe um altar, fazendo com que fique ali, e se ela quer ir embora, ajoelham, rogam, imploram para que fique, pelo menos um pouquinho mais. E ela vaidosa, desfaz malas e deita-se ao lado de seu fiel servidor. E ai ele cultivando-a se entrega, nada está bem, nada presta, não vou para este ou aquele compromisso pois não estou bem. Ah, adoraria, mas hoje não. Ah, gostaria muito, mas hoje não vai dar. Ah, sabe o que é, já tenho compromisso... e tem mesmo... O de cultuar a donzela de olhos fundos. E ela sentindo-se tão amada envolve cada vez seu servo, os braços longos como que se transformam em tentáculos e vão deslizando sutilmente e prendendo o incauto como trepadeiras que se agarram a árvores

            Às vezes você a curte por um dia, ou dois, e nesse dia, pode ter certeza, vai aparecer gente para fazer você ficar ainda mais triste. Do mesmo jeito que urubus são atraídos por carniça, existe gente que sente cheiro de tristeza, poder-se-ia dizer inclusive que alguns são viciados nele, e estão sempre rondado, em círculos vão se aproximando, se chegando, e cada vez mais perto querem saber o porquê, como, onde, como e o que aconteceu para te deixar triste. Afinal a qualquer momento vão poder evocar essas lembranças quando estiveres bem, no intuito de trazer a tristeza de volta. É a única forma que eles têm de se sentir felizes, é sentindo que alguém não está bem.
  
            O poema famoso do Neruda diz: “Estou triste, porém, sempre estou triste, venho de seus braços, para onde vou, não sei...” Que tristeza mais bela, a tristeza que faz criar poemas, imagens, músicas. O filme mais triste que vi foi “Dançando no escuro.” E alguns não gostaram exatamente por ser triste. Oras, de que serve um filme se não provoca sentimentos, se não transmite conhecimento, seja ele qual for. Em outro poema famoso, esse de Vinícius, lemos: “Tristeza não tem fim. Felicidade sim.” Os dois poemas foram musicados, fizeram sucesso enquanto música, ou seja, não sou apenas eu a cultuar vez em quando a tristeza. Adoniran Barbosa já a saudava com seu bom dia e a convidava a sentar-se e beber de seu copo. Vejam só quantas coisas belas a tristeza propicia. Tão belas que fazem da tristeza pura alegria. A alegria de ver que um sentimento dito negativo suscita a arte a apoderar-se dela e transformá-la em beleza!


quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Morrer e matar de amor...


            Ontem morreu o cantor Wando, cantor romântico que embalou romances, “pegações” e  outras nuances, fundo musical há décadas de enlaces sexuais, afetivos ou não. Cantando ora em prosa, ora em verso, realidades como em Moça: “Moça, sei que já não és pura, teu passado é tão forte, pode até machucar...”, em uma época que a virgindade ainda era condição sine qua non para que uma moça fosse considerada de respeito. Depois o cantor já não tão romântico passou a colecionar calçolas, calcinhas e tangas atiradas por fãs em seus shows. Estimulando que o fizessem...
            O público romântico é grande, haja visto a imensa quantidade de comentários, lamentos e homenagens nas redes sociais da internet. Também o sol não há como negar. Mas... Vou mais fundo, mais que o romantismo... adoro o “Passional”, aquela passionalidade intermitente que narra o fim dos casos de amor.

            Em Bilhete, de Ivan Lins e Victor Martins, interpretada por Fafá de Belém (não a dos pastéis de Belém, mas a cantora da capital paraense), há alguns dos versos mais fortes, a meu olhar pelo menos, acerca dos fins de relacionamento. “Eu limpei minha vida. Te tirei do meu corpo. Te tirei das entranhas. Fiz um tipo de aborto. E por fim nosso caso acabou, acabou, está morto.”  Difícil uma comparação mais forte... É a imagem de ressentimento e resolução. E para que não restem dúvidas do fim, prossegue: “Jogue a cópia da chave, por debaixo da porta, que é pra não ter motivos de pensar numa volta. Fique junto dos seus, boa sorte. Adeus!”

            De cara me traz a lembrança de falecidos relacionamentos, por exemplo, a de uma amiga cujo marido achou que precisava de um tempo, mesmo depois de um tempo longe, forçado pelo trabalho. Ela não teve dúvidas: “Como a casa é minha, você tem duas alternativas: ou você arruma suas coisas, ou... eu arrumo suas coisas, qual você escolhe?”.

            Muitas músicas como esta evocam imagens, caso de Espumas ao vento, de Accioly Neto, interpretada por Fagner, Ricky Vallen e estupendamente por Elza Soares. Nessa composição o autor pernambucano “chora” as mágoas de um amor que morre, tentando com o pranto e dor oferecidos, como se fosse uma dose de epinefrina, ressuscitar o moribundo amor: “Sei que errei, estou aqui pra te pedir perdão. Cabeça doida, coração na mão. Desejo pegando fogo. Sem saber direito aonde ir e o que fazer.Eu não encontro uma palavra para te dizer. Mas se eu fosse você, eu voltava pra mim de novo.” No filme Lisbela e o prisioneiro, na cena que vai à tela com a música ao fundo, a epinefrina não surte efeito, o amor já está morto, substituído, e foi unilateral. A mulher abandonada chora, limpa lágrimas, retoca pintura e vai em busca de vingança.
            Um casal conhecido, ao separar-se depois de poucos anos de convívio, onde um não queria a separação, no caso o marido, executivo bem posicionado, saiu-se com a vingança de... dividir os presentes de casamento, por pura picuinha, e levou metade das panelas. Deve ter jogado no primeiro lixo à frente, mas vingou-se.
            A Passionalidade, permitida às mulheres com choros e ranger de dentes, ganha aspecto masculino na vingança, agora um pouco mais evoluído, passa pelo financeiro. Outrora era fatal, lavar a honra com sangue era uso corrente, principalmente porque nos idos anos da história adultério era crime. Podia mandar pra cadeia. Mas os senhores de suas esposas não perdoavam, e  apenas para ficar nos casos famosos, Lindomar Castilho (que era cantor de músicas apaixonadas, passionais... Como: Nós somos dois sem vergonhas A vida imita a arte?)  e Van Doca Street foram notórios casos de desfecho funesto. Helena de Grammont e Angela Diniz foram para as covas, mortas supostamente por amor. Vieram campanhas nacionais “Quem ama não mata” e outras por condenações aos assassinos em uma época que Maria da Penha não era lei e a mulher era ainda mais desamparada.
            Mas a passionalidade musical nem sempre é tão perversa, e exceptuando Amado Batista em  Não faça jamais como eu fiz, não me recordo de outro caso acabado em morte. “Se acaso lhe acontecer de amar uma mulher da vida, você nunca deve esconder, não faça jamais como eu fiz. Matar uma pobre infeliz pelo amor que ela foi vender.” Este amor infeliz é mais comum às literaturas e caiu em desuso no cinema.
            Talvez a canção mais clássica sobre separações seja Trocando em Miúdos de Chico Buarque de Hollanda, que aprecio em todas as versões, do próprio Chico à Zezé Mota. Nela o casal faz a partilha dos bens e arremata ao dizer que o outro “Pode guardar as sobras de tudo que chamam lar.” E  no desfecho uma praga: “Aceite uma ajuda do seu futuro amor, pro aluguel.” Afinal, nos rompimentos sempre se deseja que o outro lembre que sua própria vida era melhor com aquele a quem deixa. Mas Chico deixa claro o fim com o verso: “Aquela esperança de tudo se ajeitar, pode esquecer. Aquela aliança você pode empenhar ou derreter.” E... lá me vem a memória mais um “causo”, de uma amiga que após alguns anos do término do relacionamento, já passado luto, foi empenhar a aliança, e ao ouvir da caixa: “Nossa, mas tão bonita, tão diferente, a senhora tem certeza de que quer mesmo empenhar?” respondeu a sábia amiga: “Minha filha, o marido valia muito menos, e eu já larguei. Passa esse dinheiro pra cá!”
              Renato Russo, entre muitos, prova que o coração roqueiro também sofre, em versos como: “Estamos medindo forças desiguais, qualquer um pode ver, só terminou pra você” (Os barcos).   E, aproveitando a deixa do verbo terminar, fico por aqui; se fosse uma tese ou dissertação iria fazer uma análise comparativa e discorrer sobre muitos outros casos e causos de amor e canções, mas como não se trata de... ficamos aqui, quem sabe retome o assunto em outro momento. Outras músicas.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Pauta: A síndrome da reunião

                Uma amiga carente, daquelas que ainda não resolveu os problemas de déficit de atenção da primeira infância, dizia sempre: “Reunião boa é aquela em que você sai dela com outras quatro ou cinco reuniões marcadas!” Para mim, que nunca tive a síndrome da reunião, ou a de palco, era a morte. Nada contra reuniões produtivas, mas o problema é que a maioria delas... não são!

                Uma vez ousei dizer que precisávamos ser mais pontuais e objetivos, ao invés de ficar nos auto-elogiando, dizendo como éramos lindos e maravilhosos; depois soube que haviam dito que eu era muito duro no falar.

                Bem, os adeptos de tais ajuntamento de gente vão me acusar de disfemismo, com certeza, mas o que se nota é: as pessoas não tem o menor respeito com o tempo dos outros. E tome discurso incoerente do tipo: “Isto está resolvido”, e lá vamos nós falar dele novamente daqui a cinco minutos... na mesma reunião! E tome-lhe o mesmo assunto e tatibitate... E você, com licença da enxurrada de gerúndios que o  assunto merece, vai cansando, bocejando, afundando na cadeira, e o saco enchendo, às vezes a bexiga também, e... quando finalmente o orador chega ao ponto final, você ajeita-se na cadeira e respira... ele começa tudo outra vez! Ai de mim... Deve ser o tipo de pessoa pela qual as telenovelas globais fazem flashback no meio e no fim do capítulo, do que ocorreu na primeira parte daquele mesmo dia. Devem ficar felizes da vida. Quem sabe até tenham orgasmos... Multiplos...

                Será medo de não se fazerem compreendidos? Mas raios, se estão entre adultos, aptos e em plena faculdade... Ora pois...

                Ou é a síndrome do palco? A necessidade de mostrar sua oratória, seu conhecimento de tal ou qual assunto? Ou de ser visto. Lembro de Isoldina, uma colega que nas reuniões sempre tinha o que comentar, o que dizer a respeito de tudo, num tom mais alto que os demais. Um belo dia estivemos em um aniversário de uma amiga comum, havia caraoquê (nem vou entrar no mérito da infeliz idéia que não deixou mais que fluíssem conversas), mas quem foi a primeira a pegar o microfone? A própria Isoldina. E canta, e canta, e grita, e berra, e urra, e muge... A tia da aniversariante consegue a custo tomar-lhe o microfone e começa a cantar enquanto Isoldina vai sentar-se em uma das mesas. E na metade da música... levanta e vai cantar junto com a tia, dividindo com ela o microfone! Até que a tia desiste e entrega novamente o microfone a Isoldina, que canta, que berra, que grita... É a mesma síndrome (se não for a mesma pessoa).

                Concluo daí que andam juntas: a síndrome da reunião e a síndrome do palco. A mais das vezes, muita gente com coisas a falar acaba por conter-se e desistir. Recentemente vi uma pessoa pedir a palavra por quatro vezes em uma reunião, sempre sendo dada a palavra a outro, que era interrompido por um terceiro e por um quarto que se alternavam. Nunca soube a colocação ou dúvida a ser explicitada por aquele companheiro!

                Sim, tem gente que mete o bedelho em toda e qualquer colocação que tenha a fazer, depois usa seu próprio tempo, e... pede licença e sai antes da reunião acabar por ter outro compromisso.

                Também tem gente que preside reuniões e usa da palavra mais do que devia. Por seu cargo, por sua necessidade de falar. E tome piadinha, e tome repetição, a anáfora toma conta, pode deixar...
                E ai de quem tem compromisso posterior, ai de quem ainda vai pegar metrô, ônibus ou o raio que a parta para chegar em casa, no trabalho ou simplesmente a sair do lugar da reunião que pode ser remoto, sobretudo quando se tem pólos empresariais, estudantis ou o que quer que seja em diferentes locais. Ou seja: falta de respeito com o tempo do outro.

                Para que uma reunião seja produtiva ela deve ser pontual, dinâmica, sem diálogos ou discussões fora do proposto. Sem que os carentes e necessitados de palco a tornem um catalogo de elucubrações a respeito do que já foi dito. Bem, e antes que o texto se torne o mesmo imbróglio de reuniões, querendo chamar a atenção mais do que devia, encerro por aqui. Comentários abaixo ou se inscrevam pra pauta na próxima reunião!