quinta-feira, 25 de junho de 2015

Inspirações pelas madrugadas

Levanto ao meio da noite para não perder o texto. 
 
Quantos já não os perdi, por preguiça de levantar, por puro cansaço físico? Já que dormir, isso não faço mesmo.

Fico na cama inerte, esperando o adormecer, que só vem, quando a luz do sol brigando com a cortina anuncia que já é dia. E então, é tarde para dormir.

O turbilhão de ideias que me atravessa a noite e, pela exaustão ou pelo torpor da falta de sono, tem a pretensão de me parecer brilhante, ou pelo menos, “legalzinho”...

Mas vem o dia e seus afazeres, e assim todas elas fogem. Os morceguinhos, insignificantes, na verdade, desaparecem ao primeiro sinal de movimento pela casa, pela rua... Vai ver é o café, esse falso amigo de que tanto necessito para acordar o corpo, que me faz adormecer a alma. Ou é o movimento, esse inimigo declarado da poesia, que não permite que ela me visite durante o dia. Ele está em guarda!

Mas à noite, quando eu, morto de cansaço desperto, ela qual criança traquina, vai se descobrindo aos poucos, com raiva ou ternura, desencanto ou magia, tudo depende conforme correu-me o dia, e desdobra a pontinha de seu cobertor, descobre a cabeça até abaixo dos olhos, e me olha. Quando percebe que estou alerta, cobre-se de novo... Daí a pouco, refaz o gesto, mais uma espiada... E sopra o lampejo de alguma atividade, algum texto, uma fantasia... Se me agarro a ele, ela também se levanta e se desnuda, somos noivo e noiva apaixonados, em núpcias. 
 
Já se persisto ali, desolado, exaurido, buscando o sono, amante caprichoso que não vem, ela de pirraça sopra-me palavras de amor, sussurra em mim encantamentos, indignações, iras e paixões tantas e tais que mais ainda o sono se aparta. E penso: amanhã escreverei sobre isso.

Vem o dia e finalmente... Cadê? Onde estão elas? As ideias, as palavras, as frases bem construídas? O tema?

Simplesmente não existem mais. O mote morreu!

Minha musa é ciumenta e odeia o sono, se cedo a ele, ela possessiva me abandona, faz sua trouxa e leva embora as palavras-criança. E não adianta chorar jogando catarro nos cantos das paredes, ela vai demorar a vir de novo.

Foto: Roberto Tadeu Noritomi - A lua, vista em São Paulo em 21 de junho de 2015

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Os centro do mundo

São tantos os “centro do mundo”, que não quero ser vento, para não ter que virar redemoinho, girando-lhes ao redor do umbigo.

 São tantos os “centro do mundo”, que não quero ser mar, fazendo ondas para lamber-lhes os pés.

 São tantos os “centro do mundo”, que não serei floresta que pode florescer e frutificar, apenas nas estações que escolhem.

 São tantos os “centro do mundo”, que não desejo ser nuvem, fazendo sombra onde creem ser sol. Deixo que brilhem.

 São tantos os “centro do mundo”, que não quero ser rio, levando mais vaidade onde são um oceano.

São tantos os “centro do mundo”, que eu, centro de meu mundo, cada vez mais, sou um deserto de sal, onde nada prospera. Esquecido, inóspito, e distante.


Foto: Internet - Luís XIV - Auto-proclamado: O Rei Sol Quadro de Hyacinthe Rigaud, 1701. - Luís XIV, absolutista, colocou a França em quatro guerras.